Consenso
Ainda não consegui perceber em que medida é que a transumância de Durão Barroso para a presidência da Comissão Europeia pode trazer benefícios acrescidos para Portugal; não me refiro ao país engomado dos analistas políticos e dos obedientes funcionários dos "aparelhos", dos entusiastas do privilégio e dos detentores de concepções imunes ao "provincianismo" que, queixam-se, nos tem tolhido; antes àquela "nação" de garroteados do quotidiano que, embriagada pela glória efémera do relvado ou pela indiferença crónica, ainda não percebeu o golpe de magistral calculismo de que foi objecto.
Não consigo outorgar uma onça de crédito ao (ainda) chefe do Governo português quando lhe estudo a pose e o tom que emprega, em directo e à hora certa, para asseverar que "esta não foi uma decisão fácil". Pode até ser verdade. Mas a gestão de silêncios dos últimos dias expõe ao ar, à parte o remanescente, o talento de Durão Barroso para o cálculo político. Brilhante no calendário, irrepreensível nos equilibrismos de gabinete, astuto na leitura dos sinais do magro país que vota.
O faz-que-anda-mas-não-anda do apoio institucional à candidatura do comissário António Vitorino, a remodelação do Executivo indefinidamente adiada, conduzindo correligionários e adversários às fronteiras da impaciência. Arbitrário?
Entretanto, mente-se ao país com despudor científico, tão caro à direita. "É uma decisão que honra Portugal. É uma homenagem a Portugal", explicava, ontem, em Istambul, o primeiro-ministro. E prosseguia: "Se Portugal ganha com a eventual presença de um seu nacional à frente da Comissão, é importante que Portugal não perca, agora, por causa de qualquer instabilidade política desnecessária".
A confirmar-se a inclinação do Presidente da República para a "estabilidade" das legislaturas, Portugal deve começar a preparar-se para a "instabilidade política desnecessária" decorrente das soluções artificiais que se gizam na São Caetano à Lapa.
Quanto a Durão Barroso, chega a ser comovente ouvi-lo dissertar sobre as vantagens da sua ascensão na despótica hierarquia europeia e o cunho de força que pretende impor ao órgão executivo da União a 25. Quando Zapatero, Chirac ou Ahern louvam o consenso em torno do primeiro-ministro português, estão a explicar o que dele se espera.
Sugestão: The Economist
Se pergunto por mim, uma voz ténue faz-se ouvir, a medo, sem vontade de transformar sossegos em alaridos: "Saí e não sei quando volto". "Isto não é nada bom", argumento. "Mas também não tem de ser forçosamente mau", contraponho, sabedor do desconchavo pobre e ridículo. Percebo, contudo, que caiu a noite. Outra vez.
Por ora, abstruso!... Subscrevo o que
A noite cai sobre a cauda da União Europeia e a esquerda risonha, do PS ao BE, sobe aos púlpitos para berrar que o Governo de Durão Barroso foi expressivamente penalizado. À direita, desdobram-se sorrisos profissionais e explica-se que as eleições para o Parlamento Europeu foram "atípicas".
O Bloco de Esquerda não é motor de oposição à Oposição; assim falaram, logo no arranque do cortejo eleitoral, os sábios gauchistes. Porém, a congregação abre um
"Ninguém tem o direito de ficar em casa" no próximo dia 13. Cá está a
Na edição desta quarta-feira do Diário de Notícias, a cabeça-de-lista da CDU oferece (mais) uma
À saída da estação do Metro do Marquês de Pombal, Ana Drago sorri vagamente enquanto distribui panfletos. Nas papeletas coloridas, tão ao jeito da esquerda "vigilante" que enrola lenços palestinianos ao pescoço, o Bloco apresenta uma sádica selecção de imagens do cárcere de Abu Ghraib. Não me incomoda nada que o cabeça-de-lista do Bloco ande por aí a apresentar-se como "a sina da direita, a oposição forte que diz preto no branco o que tem de ser dito"; nem sequer me chateia ver a transumância do "renovador" João Semedo, que teme pesadelos "pintados de vermelho" - congeminados no Edifício Vitória ou na Soeiro Pereira Gomes - e vê, agora, no circo Louçã a redenção dos famélicos da Terra. O que me transtorna é ver os soldadinhos voluntaristas do Bloco a agitar imagens de um crime de guerra como quem pega numa febra grelhada.
