
Prudential Plaza, em Newark, casa-mãe da Prudential Financial Inc. Os edifícios do Citigroup, das Nações Unidas e da Bolsa, em Nova Iorque. As sedes do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial, em Washington. Todas estas instituições são
potenciais alvos de um atentado terrorista de dimensões
potencialmente apocalípticas, de acordo com Tom Ridge, secretário da Segurança Interna dos Estados Unidos e, por inerência, habitual pregoeiro de um Armagedão que tarda.
O calendário dos alertas – três áreas urbanas dos Estados Unidos vivem, desde o fim-de-semana, em época laranja - emitidos pela Administração norte-americana obedece, segundo Ridge, a critérios imunes aos ditames da América política.
"Não fazemos política no Departamento de Segurança Interna. O detalhe, a sofisticação (...) desta informação, se lhe pudessem aceder, diriam que fizemos o que era correcto. O Governo deve deixar que o público saiba deste tipo de situações. Não tem a ver com política. Tem a ver com a confiança de que o Governo o revelará quando obtiver informações", explicou, citado por
The New York Times.
Ninguém pode duvidar – e, ao fazê-lo, manter um grão de honestidade - dos propósitos medievos da multinacional terrorista de Bin Laden. Por aí, Ridge e a restante corte alarmista de W. Bush mantêm-se à tona do lodaçal da melhor tradição das políticas externa e interna dos Estados Unidos. O mais assustador ensinamento que a maldade maquinal da al Qaeda trouxe ao todo-poderoso Ocidente - em Nova Iorque, Washington e Madrid – é o da elementar facilidade. É infantilmente simples chacinar, nas democracias ocidentais, milhares de civis inocentes.
E também é simples, com alguma pertinência conjuntural e sem grande sofisticação analítica, explorar a arrogância das administrações conservadoras e empurrar eleitorados cansados para alternâncias imprevistas. A al Qaeda, ou um dos esparsos grupúsculos filiais que sorvem o verbo de Usama, testou-o com dramático sucesso na estação ferroviária de Atocha, em Madrid. Não é de estranhar que os inquilinos do número 1600 da Pennsylvania Avenue, em Washington, andem nervosos com a eventualidade, muito verosímil, de uma reedição terrorista em Novembro. Por aqui, é-lhes mais complexo ficar acima do lodo.
Do outro flanco da contenda, o comportamento não é melhor do que o de W. Bush. Se é indesmentível que o presidente norte-americano quer ser reeleito com base na noção de que mais ninguém está habilitado a garantir a segurança do solo pátrio - sobretudo com a bênção de um Deus (em primeiro lugar) texano e (depois) norte-americano -, também ficamos a saber que os democratas não deixarão de fazer do terrorismo um instrumento eleitoral e pós-eleitoral, quer arrebatem a Casa Branca ou incinerem mais um candidato.
Em declarações à CNN, a conselheira de John Kerry para as questões de segurança interna, Susan Rice, achou por bem sublinhar que o último alerta de Tom Ridge vem demonstrar que a América "ainda não está tão segura como
poderia ou
deveria estar".
O aproveitamento é subtil. Mas não deixa de ser um aproveitamento. Ainda que Susan Rice garanta,
a posteriori, que "os terroristas não nos dividirão" ou que "John Kerry e John Edwards trarão todos os aspectos do poder da nossa nação para
esmagar a al Qaeda e
destruir as redes terroristas", o posicionamento é esclarecedor. Se, em Novembro, John Kerry for eleito para a Casa Branca, será no mínimo interessante acompanhar a relação da sua administração com a premissa de que "o Governo deve deixar que o público saiba" – a fórmula é de Tom Ridge, mas assenta às duas forças políticas que, ciclicamente, se revezam no poder.
A verdade é que a tentação de burilar a opinião pública, com o recurso a um argumento tão aterrorizador, é demasiado grande; para democratas, aspirantes à
liderança do mundo livre, e republicanos, aspirantes à manutenção da ordem bélica internacional. Uns e outros empregam retóricas subtilmente dissonantes para um mesmo fim imperialista.
A reacção mais "revoltante" – a expressão é do senador democrata Joe Lieberman, ex-candidato à Presidência preterido nas Primárias – coube ao desbocado Howard Dean, que, à
CNN, cometeu a suprema imprudência de dizer a verdade.
"Estou preocupado porque, quando acontece alguma coisa que não é boa para o presidente Bush, ele joga o seu trunfo, que é o terrorismo. Toda a campanha [republicana] é baseada na noção de que ‘eu posso manter-vos a salvo, por isso, em tempos de dificuldade para a América, fiquem comigo. É simplesmente impossível saber quanto disto é real e quanto disto é política. E eu suspeito que há um pouco de ambos".
Em Novembro saberemos quanto vale, na contabilidade eleitoral, um punhado de ruas nova-iorquinas recheadas de polícias equipados com coletes à prova de bala e metralhadoras. Até lá, pode ser que, em Nova Iorque, Washington e Newark, não morra ninguém por culpa de quem manda. Para
o resto do mundo, com a Mesopotâmia à cabeça, é demasiado tarde.